16 de mai. de 2012

Poesia não é para entender*

Texto da Revista Erráticade Antonio Cícero, sobre a natureza do poema. Muito bom, conquanto de leitura trabalhosa, faz parte de seu mais recente livro, Poesia e Filosofia.
Trechos das conclusões do texto:
  • o fato de que o poema não diz coisa alguma (isto é, não se distingue daquilo que diz) não quer dizer que não contenha palavras com significados usuais, sentenças ou conceitos que digam coisas, mas sim que essas palavras, sentenças e conceitos têm, nele, funções subordinadas à da constituição de um objeto estético;
  • o fato de que o poema não diz coisa alguma não quer dizer que ele não seja produzido pelo pensamento ou que não provoque o pensamento do leitor. O poema solicita todos os recursos do poeta e/ou do leitor: intelecto, sensibilidade, imaginação, intuição, razão, experiência, emoção, humor, vocabulário, conhecimento, abertura para aceitar o que o acaso e o inconsciente oferecem etc.
  • A apreensão estética do poema não é puramente formal, vazia ou indiferente a qualquer conteúdo. A ausência de interesse ao julgarmos genuinamente se algo é belo (Kant) significa que não levamos em conta as vantagens ou desvantagens para nós de tal juízo. Isso, porém, não quer dizer que fiquemos indiferentes a qualquer das possibilidades que nos atravessem, ao contemplá-lo.
  • Livramo-nos do cálculo utilitário ou moral justamente para deixar que a obra, resplandecente, provoque em nós o jogo livre das faculdades cognitivas. É nesse jogo livre, e não na pura apreensão sensível que, segundo Kant, reside o prazer estético.
* "Poesia não é para entender / é para incorporar. / Entender é parede. / Procure ser uma árvore." (Manoel de Barros - Arranjos para assobio)

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